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EDUCAÇÃO É DEVER DO ESTADO E DA FAMÍLIA

Atualizado: 5 de abr.

Na próxima semana, se iniciam as aulas do primeiro semestre acadêmico da Universidade Federal de São Paulo, tardiamente porque houve greve de docentes, técnicos-administrativos e discentes em 2024. O primeiro módulo de uma das disciplinas que ministro é “Educação como processo social”, entendendo que a educação é o meio pelo qual as pessoas se apropriam da cultura e do conhecimento produzido na sociedade, tendo a função de contribuir para a reprodução e para a transformação da sociedade, ao mesmo tempo, pois é um espaço de contradições.


O direito à educação é considerado um dos direitos fundamentais para o exercício da cidadania. Desde a Constituição Brasileira de 1946, a educação é considerada como direito de todos e dever da família e do Estado e o Art. 205 da atual Constituição, de 1988, aponta que:

“A educação é um direito de todos e um dever do Estado e da família, promovida com a colaboração da sociedade para o pleno desenvolvimento da pessoa, o preparo para o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho”.

Desta forma, fica claro que a família é responsável pela educação da criança desde o seu nascimento e o Estado é responsável pelo ensino formal – escola – lugar onde se realiza o processo educativo, a apropriação do conhecimento historicamente construído. Há tempos, existe uma discussão em torno da relação escola-família, pois a primeira entende que muitas famílias não assumem a responsabilidade pela educação de seus filhos, o que provoca indisciplina nas salas de aula e atrasos no processo de ensino e aprendizagem.


Os pais ou responsáveis ensinam a falar, se vestir, se alimentar e cuidar do corpo (higiene). O falar não significa apenas nomear as coisas, mas se comunicar com as outras pessoas, respeitando-as, por exemplo: “Ouça a sua mãe”; “Fale mais baixo”. No entanto, em algumas famílias, são os filhos que ditam as regras, fazendo o que querem, por exemplo: crianças correndo em ambientes fechados como igreja; crianças/adolescentes se alimentando de junk food a qualquer hora do dia; crianças/ adolescentes utilizando celular e/ou tablet sem limite de horas e sem supervisão.


É certo que algumas famílias estão desestruturadas e outras deixam de estabelecer limites e aceitam o comportamento dos filhos. Mas ainda temos famílias que assumem a educação de seus filhos, que fazem lição de casa junto. Naquelas famílias que ainda se mantém o habito de reunir para alguma refeição junto, é possível que o espaço coletivo possibilite o compartilhamento de situações vivenciadas na escola pelos filhos. Aqui quero citar dois exemplos: um meu e outro do meu filho. Eu estava na 3. série de uma escola pública que ficava a quatro quarteirões de minha casa. Estudava de manhã e meu irmão estudava à tarde. Ia a pé e sozinha para escola. Na volta, chegava em casa morrendo de fome e ia direto para o almoço. Meus avós paternos moraram muitos anos conosco e a mesa que tinha na copa-cozinha ficava lotada com seis pessoas. Meu pai tinha estudado até a quarta série e minha mãe até a oitava, mas eles eram pessoas esclarecidas e preocupadas com a educação dos filhos, sempre acompanhando as lições e as notas.


Uma vez, quando eu voltava da escola, um menino chamado Anderson me seguiu, começou a falar comigo e perguntou se eu queria namorar com ele. Quando cheguei em casa, enquanto a gente almoçava, eu contei o que tinha acontecido. Todos me apoiaram e a minha avó (Luiza Noventa) combinou que no dia seguinte iria me esperar na saída da escola e eu iria mostrar o menino para ela. Feito. Ela deu a maior bronca no menino. Nunca mais ele chegou perto de mim (hahaha). Esse episódio me deu muita confiança em mim mesma e na minha família. Montessori, em seu livro Mente Absorvente diz que:

“Nenhum de nós foi sempre adulto. Foi a criança quem construiu nossa personalidade”.

A casa de meus pais era simples, um banheiro para sete pessoas, uma típica família de classe média. Mas havia amor, respeito, diálogo, limites, apoio e fé em Deus. Acredito que esse contexto familiar forneceu a base para a construção da adolescente/adulto que sonhava com a PAZ e era confiante no caminho que estava trilhando, apesar de todas as incertezas quanto ao curso superior, a profissão e o futuro. E nesse contexto, com 16 anos, pintou uma tela chama da “PAZ”, que ilustra esse texto e está em uma das paredes de minha casa até hoje. Lembro- -me que escrevi uma poesia que acompanhava a tela, mas não a encontrei. Sempre fui uma das melhores alunas e entrei direto na UNICAMP quando terminei o Ensino Médio – meus pais cumpriram o dever/responsabilidade com a minha educação, conforme previsto na Constituição.


O segundo exemplo, meu filho: uma vez, enquanto jantávamos, meu marido perguntou ao meu filho, que estava no 4. ano: “Rapha, você tem lição de casa?” Ele parou de comer, pensou um pouco e respondeu: “Eu não tenho lição de casa, mas eu tenho uma atividade que não terminei na aula, porque eu estava ajudando a M. (menina com Síndrome de Down)”. Perguntado se a professora tinha pedido para ele ajuda-la, respondeu: “Ela não precisa pedir. Todos sabem que a M. precisa de ajuda”. Daí, seguiu-se uma conversa sobre solidariedade e amor ao próximo, temas que já eram explorados em casa. Após o jantar, hora de fazer a lição de casa e o Rapha realizou a atividade dele sem reclamar. Aliás, eles sentavam para fazer a lição e eu e meu marido ficávamos juntos para acompanhar. Às vezes, era chato, mas tinha atividade que a gente se divertia junto e o Rapha, além de fazer a lição dele, queria fazer a da irmã mais velha. Ele não se cansava. Se terminava tudo, pegava papel, lápis e começava a desenhar e escrever. Sempre foi criativo. Um artista! Hoje, cursa doutorado em Filmes e Mídia na Universidade da Califórnia – Irvine. Esses dois exemplos são reais. Eu fui a primeira da minha família a cursar o ensino superior, como muitos dos meus alunos da Unifesp. Considero relevante dar luz a casos reais como contraponto a histórias fictícias trágicas. No artigo da próxima semana, abordarei bullying e cyberbullying, pensando em alternativas de superação para a questão.




2 Comments


Debora Fogli
Mar 30

Excelente reflexão Profª Doutora Marilena Rosalen. Se pararmos para pensar, as políticas públicas que conquistamos com movimentos sociais e lutas ao longo da História, era para estarmos num lugar melhor nos índices relacionados a educação, e não pior como muitas vezes vemos hoje. O professor, em nosso país é desrespeitado e desvalorizado. Se cada um fizesse sua parte, escola e família, talvez tivéssemos nos noticiários mais exemplos de sucesso do que de derrotas neste setor. Porém, como professora da rede pública de São Paulo, percebo uma terceirização da responsabilidade da educação para escola, para o celular, para os avós e ou outros familiares, para quem quer que seja, com o disfarce chamado, hoje, de rede de apoio. Seria o capitalismo…

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Guest
há 9 minutos
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Querida Debora, obrigada pela sua reflexão. Forte abraço.

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